domingo, 20 de novembro de 2011

RPG e suas multiplas narrações

Sabe quando você se pergunta "mas o que é que eu tô fazendo aqui?". Pois é, as vezes eu fico procurando uma linha entre o fato de eu ser formado em jornalismo, em história e o que diabos isso tudo tem a ver com RPG. Pô, mesmo passando dos 30 anos de idade, eu jogo todo santo sábado, escrevo sobre RPGs nesse blog e ainda tenho outro blog só para estórias e histórias específicas do grupo de jogatina que faço parte. É muito tempo investido em uma atividade, precisaria ter uma relação com o que faço de trabalho. Não que essa dúvida me tire o sono, mas se tivesse alguma relação ajudaria a dormir melhor.

Eis que essa semana tive aquilo que os psicanalistas chamam de insight. Lendo um livro da Marialva Barbosa sobre história da televisão no Brasil (tema da minha dissertação de comunicação), ela, a autora que é formada em comunicação com doutorado em história, fala que a história é uma narrativa. Não vou me deter nisso, pois prometi a mim mesmo não ser acadêmico nesse blog, mas ali é utilizada referências do filósofo francês Paul Ricoeur. Continuando, a autora vai falando sobre traços e vestígios deixados pelo ser humano no qual o historiador junta para a sua narrativa de um tempo irrecuperável: o passado.

Eureca! Foi naquele momento que tudo fez sentido. Primeiramente, jogar RPG é se comunicar de uma maneira extremamente qualificada, principalmente quando beiramos os 30 ou mais anos de idade. Narrar para uma galera mais velha exige paciência para ouvir, exige uma capacidade de argumentação para lidar com amigos que são tão inteligentes ou mais que você. Dentro de uma jogatina, contar uma história em conjunto, tendo em conta o que cada colega pode render, é uma maneira moderna de fazer algo tão antigo quanto a própria humanidade (contar causos) e assim o poder comunicacional é fundamental.

E tem a História, disciplina, nisso tudo. Mas ora bolas! Se a História é uma narrativa, que mais útil nesse trabalho de historiador que a imaginação de poder "ver" os fatos que ocorreram. Explicando melhor, lembro-me bem (demais) que quando eu lia um texto, livro ou artigo durante o curso de história, conseguia visualizar aquilo de uma maneira quase tocável. As caravelas cruzando os mares, os escravos, quilombos, as rebeliões de independência, as revoltas, revoluções, os golpes... tudo sempre foi muito visual para mim. E quando meus colegas me perguntavam (ou me perguntam) "como raios você lembra de tudo isso, cara???"; dá vontade de dizer "pô, eu vi tudo".

Seria uma resposta mentirosa, mas o ponto em que eu quero chegar é que se um livro de certo historiador é uma narrativa de certo momento histórico (sujeito, portanto, a interpretações e etc.), não deixa de ter uma relação com aquela narrativa da mesa de RPG. Mera relação, pois como diria o tal do Ricoeur, há uma diferença entre "achar" e "inventar", sendo o RPG um espaço para a invenção. Seja como for, quero dizer que quando faço minhas pesquisas, pego um "rastro" humano e tento juntar as peças daquele quebra-cabeça, é impressionante o quanto estou visualizando a tal história que estou "narrando" (a narração do "acho"). Essa capacidade de ver tem sido exercitada sobremaneira cada vez que sento e uma mesa e jogo.

Mas o que veio primeiro, o ovo ou a galinha? Ou seja, o RPG me deu subsídios para o fato de "historiar" ou a disciplina História me deu subsídios para "narrar" (narração do "invento")? Não sei e tanto faz. Minhas jogatinas vieram antes da universidade. Os livros de história que lia e a própria disciplina História que aprendia na escola (e que adorava) vieram antes das jogatinas. Desde pequeno, como qualquer criança, tenho a imaginação fértil e o que posso dizer é que com o RPG nunca parei de pôr mais humo nessa plantação. Posso dizer ainda que fazer e estudar história, vejo bem agora, me mantém nessa linha imaginativa, já que para mim, fruto do que quer que seja, essa narração da História é algo muito visual e viva, de maneira muito parecida com as visualidades de uma jogatina de RPG de mesa, considerando não apenas os prós, mas também os contras desse fato que, acima de tudo para mim, levanto.

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