sexta-feira, 28 de outubro de 2011

ARTE E MÍDIA: a análise de um texto

1- Identificando os procedimentos do autor em cada parágrafo

P1: No primeiro parágrafo do livro, a introdução, o professor Arlindo Machado busca contextualizar o leitor no que diz respeito ao conceito de ARTEMÍDIA, explicando já de maneira fácil e direta do que se trata o livro como um todo sem deixar de ser amplo e profundo.

P2: Em seguida, Machado vai ampliar o conceito para além de quesitos técnicos, passando a debruçar-se na divisão da expressão, ou seja, a “arte” e a “mídia” para melhor analisa-lo ao longo de toda a obra, deixando o gancho para o que será o capítulo seguinte. Aqui já se encerra a introdução.

P3: No que seria um segundo capítulo titulado “Arte e Mídia: aproximações e distinções”, Arlindo Machado passará por sobre a teoria de Walter Benjamin e o seu artigo principal, “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”. Como é de costume de Machado, as idéias são colocadas em sua obra sem que as referências sejam devidamente citadas. Em todo caso, ficará claro que, como diz o professor, “A arte sempre foi produzida com os meios de seu tempo” - o que nos remete ao frankfurtiano Benjamin, para assim a obra chegar ao conceito de arte e mídia na sociedade contemporânea.

P4: Neste parágrafo, Arlindo Machado dissertará belamente sobre como a arte se apropria de aparatos tecnológicos que não são produzidos, em sua origem, pensados para um uso artístico. Porém, o artista não se limita a ver uma “máquina” apenas para o uso que lhe foi conferida e a subverte para produções artístico-culturais de toda a sorte. O capítulo é encerrado com a trajetória que desemboca no nascimento da poderosa indústria fonográfica.

P5: Dentro da mesma idéia de indústria fonográfica e sua reprodução em série para o acumulo de capitais no sistema vigente –ou seja, o capitalista –Machado vai contextualizar o cinema, a fotografia, o vídeo e o computador no mesmo eixo, concentrando-se nas peculiaridades desta última máquina –o computador- e o impacto da digitalização nas produções artísticas.

P6: Neste momento, o professor Arlindo expõe as qualidades da imagem digitalizada dentro da lógica da reprodutibilidade técnica.

P7: Agora, de maneira complexa, as limitações da imagem cinematográfica digitalizada são expostas, permitindo perceber os pontos mais fracos desta “compactação da imagem” em sua forma digital, não permitindo nuances que a pintura, por exemplo, permite.

P8: Em uma área de conhecimento em que Arlindo Machado domina como poucos no Brasil, ele passa a falar de obras artemidiáticas produzidas nos primórdios desta produção artística, lembrando que a arte é um grande desvio em termos perspectivos do uso que originalmente se atribuiu a determinadas maquinarias, lembrando obras de Nam June Paik, Frederic Fontenoy e outros.

P9: A partir daqui, Machado –novamente sem fazer citações bibliográficas diretas –vai começar a introduzir as teorias de Vilen Flusser e a idéia de artista em contraposição ao funcionário diante de uma máquina.

P10: Machado trabalha um exemplo que remete à teoria de Vilen Flusser.

2. Avaliar o texto:

A - parágrafo inicial: o parágrafo inicial, parte componente da introdução, está bem contextualizado, trazendo a origem norte-americana do termo artemídia e explicando por uma perspectiva ao mesmo tempo universal e local. O tema é relevante por termos poucos trabalhos de artemídia realmente conceituados no Brasil, o que justifica a obra do autor que, embora curta e de rápida leitura, é esclarecedora. Acredito que artistas como um todo devem ler a obra, em especial o que lidam com vídeo e produção de imagens.

B- O tema está bem definido e proposta de forma objetiva e comunicativa, característica das obras de Arlindo Machado. Podemos dizer que dentro da temática abordada, Machado é a maior autoridade entre acadêmicos no país, pois este livro é obra que dá continuidade a outras publicações suas, como “Máquina e Imaginário”, publicada já em 1993. Embora isto esteja posto, ficaria como crítica ao autor o fato de ele pouco fazer referências bibliográficas nesta obra e, diga-se, no conjunto de suas obras como um todo. Ainda que não ocorra a citação, percebe-se a pesquisa realizada na área e a citação implícita de autores que Machado faz, demonstrado ser pessoa de grande erudição.

C- A idéia é desenvolvida com maestria. Para uma obra tão pequena, o tema está por demais encorpado. Vale lembrar que Arlindo Machado é o maior curador de exposições de artemídia no país, tendo em seu currículo curadorias desde a década de 1980, entre elas “Arte e Tecnologia” (MAC-SP, 1985), “Cinevídeo” (MIS-SP, 1992-3) entre outras que ocorreram recentemente, como Emoção Art.Ficial II. Envolvido com pesquisa e com a arte em si, podemos dizer que suas idéias são desenvolvidas com real conhecimento de causa, embora a sua metodologia –perfeita em seu desenvolvimento- peque, como já foi dito acima, pela falta de citações diretas dos autores a quem toma emprestado as suas idéias. Os exemplos citados são quase pedagógicos, facilitando o entendimento do tema e da teoria que norteia certa caminho a ser traçado e os argumentos são consistentes e dignos de alguém que é visto por muitos como a autoridade maior no assunto.

D- O referencial teórico é adequado. Falta a citação direta de várias idéias, o que pode levar um leitor meramente curioso a pensar que a idéia de “era de sua reprodutibilidade técnica” tenha sido criada recentemente e não, como sabemos, no final da década de 1930. Todavia, ao final do livro não faltam jamais os livros de Benjamin. Quanto à idéia emprestada de Flusser, Machado foi mais generoso e dedicou um pequeno capítulo a falar deste pensador, já que podemos afirmar que o professor Arlindo é quase um discípulo do filósofo checo, pois foi parte do círculo flusseriano quando este esteve no Brasil fugido da Europa Oriental. Podemos dizer, portanto, que em função de sua metodologia de escrita e apresentação de idéias, Machado quase não faça citações, deixando o seu texto fluente e quase que apenas com “idéias próprias”. Todavia, quando faz citações ou paráfrases, o faz com conhecimento e, podemos dizer, em casos em que é extremamente necessário.

E- Ainda que estejamos falando de uma obra rápida (a publicação nem chega a ter 100 páginas e é em formato de livro de bolso) não faltam fontes primárias e secundárias. Há uma bibliografia semi-comentada ao final da obra, no qual constam as fontes e as referências bibliográficas, demonstrando se tratar de uma mera escolha por tornar o texto fluente, esta maneira de citar as idéias de outrem (uma escolha questionável, mas consciente).

F- Os parágrafos estão bem conectados, não faltando ao final de um que termina, conexão com o que começa, o mesmo ocorrendo com os capítulos. Tudo apresentado de maneira fluente, objetiva, ampla, profunda e bem estruturada.

G- A obra apresenta alguns gráficos extremamente simples para explicar conceitos básicos de semiótica. Quanto a notas e citações, estas estão presentes ao final da leitura, de maneira conectada com palavras do autor como “as idéias de tal página foram tiradas de tal autor em livro x”. Embora seja preferível, a meu ver, notas nas páginas em que foram feitas as citações, isto deixa claro duas coisas: em primeiro lugar que se trata de uma obra realizada para a fluência e a leitura fácil (dada, inclusiva, o apelo mercadológico do tema). Em segundo lugar demonstra a primazia pela fluência em vez de um certo academicismo.

A pequena obra apresenta algumas críticas já visíveis em outras publicações do autor, porém nada que venhamos a dizer que nas idéias de Arlindo Machado, o que é apresentado não há relevância. Pelo contrário, na linha de Canclini, também citado no livro Arte e Mídia, apresenta formas e formatações enquanto propostas que só podem ser dadas dentro de uma idéia de apropriação e transformação de arte e das tecnologias que poucos poderiam formular com tanta objetividade e clareza quanto Machado. Para o acadêmico, deve ser lido junto a outras obras do professor Arlindo, porém, para um curioso, será uma obra de valor quase transcendental, principalmente se este curioso for um artista sem pretensões outras que não seja o conhecimento pelo simples conhecer.

MACHADO, Arlindo, Arte e Mídia, Rio de Janeiro: Zahar, 2007.

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