sexta-feira, 28 de outubro de 2011

De aforismos e montanhas

Fazia algum tempo que eu esperava as ditas aulas que colocavam em diálogo Nietzsche e a comunicação. Entre alguns alunos mais interessados, já comentávamos tal diálogo era em si intrigante e que fosse por qual fosse o motivo, valeria a pena assisti-las.

Minhas histórias pessoais com as obras de Nietzsche sempre foram curiosas. O primeiro livro que li do filósofo foi Ecce Homo e quando me pus a ler acreditei que não iria realmente gostar do que estava por vir, porém, tenho um ditado pessoal o qual diz que “clássicos não devem ser apenas discutidos, devem ser lidos”. Assim, a qualquer momento eu iria passar por Nietzsche ainda que fosse por mera formalidade intelectual.

Pois bem, não preciso dizer o quanto foram avassaladoras as palavras do filósofo alemão a cada página que lia. Virei fã incondicional de Nietzsche e me pus a ler mais sobre ele e do que ele escreveu.

Domino um pouco da língua e acabo por conviver com diversos círculos de alemães nos quais pude fazer alguns debates. Porém, notei que a percepção que adquiri da obra nietzschiana era um tanto distinta, principalmente em função do fato ao qual alguns dos adeptos deste autor acreditavam que a obra era uma ode a um estilo de vida de certa forma pedante, para não dizer diretamente arrogante. Eu, de minha parte, não via da mesma maneira.

Acredito, antes de mais nada, que a vida miserável que levou Nietzsche, entre a eterna angústia e loucura solitárias, não o direcionaria à arrogância pura e sim à percepção que ele mesmo tantas vezes bradou e da qual eu compartilho: ele era um homem à frente de sua época. Em seu Zaratustra dizia: “para os homens sou algo intermediário entre o doido e o cadáver ”.
Acreditar ser visto desta maneira pelos homens não é motivo de orgulho em momento algum da obra nietzsciana, obra intrinsecamente ligada à sua própria biografia. Tal maneira de ver o mundo e por ele ser visto, levou-o a desconfiança total e o fez abandonar a vida social em 1881, ano em que tentou o suicídio por três vezes. Por estas razões, vejo em Nietzsche um visionário fora de sua época, que tira

Mesmo a idéia de supra-homem é um ideal de humano a que Nietzsche desejava para a humanidade como um todo e não apenas para si. O próprio Zaratustra, alterego do filósofo, angustiava-se por não ser a sociedade ainda composta por supra-homens, mas a superação do homem para esta nova fase seria tão natural quanto a do homem em si diante do macaco. “Que é o macaco para o homem? Uma zombaria ou uma dolorosa vergonha. Pois é o mesmo que deve ser o homem para Super-homem (Übermensch): um irrisão ou uma dolorosa vergonha ”.

Mas continuando na narrativa de minhas histórias pessoais com a obra de Nietzsche, crio que após o Ecce Homo eu realmente finalizei a leitura da obra com duas idéias principais. A primeira era a de que para escrever uma autobiografia colocando-se como superior aos amigos e a humanidade como um todo, havia mais de loucura do que de soberba naquele homem. A segunda idéia era mais clara, era que seria impossível ler uma obra de Nietzsche sem ser profundamente tocado por ela. E desta maneira segui, meses depois de Ecce Homo, para o Zaratustra.

Nestes entremeios de leituras, sabíamos, pela grade curricular, que em breve teríamos, como já foi dito, uma disciplina no mestrado na qual Nietzsche seria colocado diante de questões comunicacionais. Estamos falando de 2009. Muitos fizemos a disciplina e, na semana seguinte à disciplina, passe um trabalho de análise fílmica para meus alunos de produção audiovisual. Para a resolução do trabalho, cada aluno escolheria um filme e uma aluna acabou por escolher coincidentemente o filme quando Nietzsche chorou.

Após fazer a disciplina estar com este filme na mão, seria impossível não assistir a tal história. Assisti e fui tocado pelo filme. Decidi então que era hora de ler mais uma obra nietzschiana. O livro escolhido foi “O Anticristo”. Um livro forte, cheio de caos e verdade. Desrecomendado para carolas e beatos.

Enfim, foi chegada a hora de fazer o trabalho da disciplina do mestrado e a tarefa era comentar cinco aforismos de Nietzsche. Eu, de minha parte resolvi subverter um pouco essa Aufgaben e comentar quatro aforismo e o dito filme do qual falei. Acho até mesmo que já citei dois aforismos de Nietzsche e que se quisesse ficar com apenas mais três (ou mais dois e o filme) daria conta do recado passado pelo professor Dr. Francisco. Mas vamos devagar devagarinho, matando um leão por vez. Nietzsche disse em seu Zaratustra que um aforismo é como ligar os topos de duas montanhas. Não é necessário percorrer os longos caminhos entre um topo e outro se em um homem existe a capacidade de compreender os aforismos –e claro, de criá-los.

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